Entrevista com Catarina Gralha

08/11/2017

A aventureira do Mundo Indefinido

  • A Catarina é uma estudante portuguesa, não nasceu rica nem ganhou o euromilhões mas já andou a cavalo na Mongólia, de comboio na Rússia e andou às compras em Goa! O facto de ser super organizada e atenta a cada detalhe da viagem certamente ajudam a que consiga viajar sem gastar fortunas... Em entrevista ao Hostelsclub a Catarina partilha algumas das suas aventuras e ainda umas quantas dicas que a ajudam a desfrutar ao máximo de cada viagem e certamente também te ajudarão a ti! ;)

  • 1 - Olá Catarina! Pela leitura do teu blog percebi que já visitaste destinos tão exóticos quanto a Mongólia e a Índia! Quando e como é que começaste a viajar para destinos fora da Europa? Como é que decides para onde vais a seguir?

  • India

Foto de Varshesh Joshi do site Unsplash

  • Olá Hostelsclub! Eu comecei a viajar para fora da Europa há muito pouco tempo, na verdade. Sempre viajei imenso dentro de Portugal com a minha mãe, e já conhecia alguns países do velho continente, mas foi só no início de 2015 que sai efectivamente da Europa. A Índia surgiu em Janeiro de 2015, e fiquei completamente rendida. Estive apenas em Goa, e sei que o resto da Índia é bastante diferente, mas adorei este país. Tanto que um dos meus sonhos é percorrer a Índia de comboio.
Eu quero conhecer o mundo todo (sim, é um pouco ambicioso, mas eu gosto de sonhar alto), por isso sou movida maioritariamente pelo preço dos bilhetes de avião. Claro, há países pelos quais tenho um interesse especial, mas no geral o que dita a próxima viagem é o orçamento. Tenho um companheiro de aventuras que alinha nisto comigo, e normalmente olhamos para o mapa e vemos o que falta conhecer. Tendo em conta o dinheiro que queremos e podemos gastar, escolhemos o destino seguinte.
  • 2 - A Índia ou se ama ou se odeia, é que o diz quem já lá foi… tu odiaste ou amaste?
Angra - India
  • Foto de Parvesh Jain do site Unsplash
Acredito que a Índia seja mesmo assim: ou se ama ou se odeia. Sei que não é um país para toda a gente, mas também depende do local onde se vai. Num país tão grande, há zonas que são mais fáceis para viajantes europeus, onde o choque cultural não é tão grande, como é o caso de Goa. De qualquer das formas, vai haver sempre algum choque: há pobreza, há lixo, há vacas por todo o lado. Há uma imensidão de pessoas, de cheiros (por vezes não tão agradáveis), de buzinas a todo o instante. Mas também há cores maravilhosas, sabores incríveis, uma natureza linda e um povo amistoso. Na Índia, tudo é diferente. E acho que foi isso que me cativou, o facto de ser tão diferente de tudo aquilo a que estava habituada. No fundo, acho que o que gosto mesmo é de sair da minha zona de conforto.
  • 3 - E saindo a da tua zona de conforto já viveste alguma peripécia que hoje em dia dá para rir mas na altura nem tanto? Alguma história que gostasses de partilhar?
Mongolia

Foto de Jeremy Cai do site Unsplash

É engraçado, porque mesmo indo um pouco à descoberta e fazendo praticamente tudo por conta própria, felizmente nunca estive em nenhuma situação de perigo grave, por exemplo. O pior que me aconteceu foi na Mongólia, onde tive uma (pequena) preocupação. As estradas na Mongólia são praticamente inexistentes fora da capital, e o que existe é uma mistura de pedras, buracos e terra batida. O condutor da carrinha onde me encontrava tinha tendência para acelerar, o que fazia com que andasse aos saltos dentro da carrinha (que não tinha cintos de segurança), quase chegando a bater com a cabeça no tecto. Quando começou a chover, o condutor não abrandou a velocidade. Junto com a água da chuva, as “estradas” transformaram-se em lama. Lama escorregadia e um condutor a uma velocidade alucinante! Poças de água começavam-se a formar à nossa volta e, a dada altura, senti que a carrinha não estava a seguir as ordens do condutor. Estávamos a aquaplanar! Por momentos, temi o pior, mas nada aconteceu e passado pouco tempo o condutor já estava de novo em controlo do veículo.

Tive também algumas peripécias engraçadas devido à barreira linguística, mas no final corre sempre tudo bem.

4 - Bem, nessa situação não havia grande coisa que pudesses fazer se não agarrares-te bem haha :) mas relativamente a outras peripécias como é que se resolveram? Como é que se lida com situações inesperadas no estrangeiro?

Russia

Foto de Ant Rozetsky do site Unsplash

Sim, aí não tinha grande alternativa, só mesmo agarrar-me bem! Mas como disse, nunca estive numa situação de perigo grave. Tive uma situação engraçada em que entrei num autocarro que ia para o terminal, em vez de seguir o seu caminho normal. Foi só quando o autocarro virou à direita em vez de virar à esquerda, como era o seu percurso (e eu já o tinha feito), que percebi que algo estava errado. Assim, vi-me perdida no meio da Rússia, num sítio onde ninguém falava inglês, e sem mapa. Nessa situação, a única coisa que me ocorreu foi fazer o caminho inverso e voltar à estação de partida.

Situações inesperadas vão sempre acontecer, de maior ou menor dimensão. Eu felizmente só tive coisas assim pequeninas, mas acho que o princípio é sempre o mesmo: o mais importante é tentar manter a calma. E há certas coisas que faço que me dão mais alguma segurança. Por exemplo, eu tomo sempre nota das moradas e dos telefones das embaixadas ou consulados portugueses mais próximos do local para onde vou, assim como os números da polícia e bombeiros. Em caso de emergência sei quem devo contactar. Caso Portugal não tenha representação diplomática nesse país, procuro outros países da União Europeia. Também tenho sempre uma versão em papel de todos os meus documentos, assim como uma versão digital, que posso aceder tanto online como offline a partir do telemóvel. E desse esse episódio na Rússia que guardo todos os mapas das cidades offline.

5 - Para além de viagens só por si, sei que já tiveste outro tipo de experiências no estrangeiro. Nomeadamente que trabalhaste num campo de férias na Rússia, fala-nos dessa experiência!

Campo de férias na Rússia

O voluntariado é uma excelente forma de se viajar! Em 2013 decidi que queria fazer algo diferente no verão, e surgiu a oportunidade de ir ensinar crianças num campo de férias na Rússia, perto da região de Volgogrado. Foi, sem dúvida, uma experiência muito enriquecedora, e quero repetir, talvez em África. É mesmo juntar o útil ao agradável, porque sentimos que estamos a ter um impacto positivo no mundo, ao mesmo tempo que exploramos novos lugares e conhecemos culturas diferentes, a um custo mais baixo. Isto porque, no meu caso, a alimentação e o alojamento estavam incluídos. A verdade é que o voluntariado (no estrangeiro mas não só) não é algo que fazemos só para os outros... Na altura, até me senti um pouco egoísta. Sim, estava a ajudar, mas a experiência também me ajudou imenso, a vários níveis. Nunca tinha estado tanto tempo fora de Portugal (foi cerca de mês e meio) e aprendi muito ao estar num país diferente, com um idioma que eu não dominava. É uma situação diferente de “apenas” férias, porque tens responsabilidades e horários, mas recomendo a toda a gente.

Para além dessa experiência de voluntariado na Rússia, mais recentemente estive 6 meses no Canadá como parte do meu doutoramento. Era trabalho, mas aproveitei ao máximo os fins-de-semana e todos os bocadinhos que tinha livres para explorar a região onde estava. E ainda dei um salto aos EUA!

Canada

Foto de Megan Lewis do site Unsplash

As experiências foram diferentes, mas foram ambas muito positivas, e quero repetir. Há diversas opções interessantes para quem quer viajar e trabalhar ou fazer voluntariado, e hoje até é bastante fácil, havendo algumas plataformas que ajudam na procura, como é o caso do Workaway (https://www.workaway.info/) e do Worldpackers (https://www.worldpackers.com/) - que ainda não experimentei, mas conto fazê-lo.

6 - Destacas como uma das tuas grandes viagens o transiberiano, gostarias de falar um pouco sobre essa experiência?

Russia

Essa é uma pergunta perigosa, se não queremos ficar aqui o dia todo :) Podia ficar horas e horas a falar sobre o transiberiano… Na realidade, o que eu fiz foi o transmongol (o transiberiano clássico não sai da Rússia), atravessando 3 países: Rússia, Mongólia e China. Há muito tempo que queria fazer esta viagem, percorrer quilómetros em caminhos-de-ferro sempre me atraiu. Talvez porque o comboio é o meu meio de transporte preferido. Só tem vantagens: conseguimos ver a paisagem lá fora e não há trânsito!

A viagem demorou cerca de um mês e começou em São Petersburgo. Segui para Moscovo e depois foram alguns dias de viagem até Irkutsk. Dali, fui para Ulan-Ude, a última cidade que visitei na Rússia. De Ulan-Ude cruzei a fronteira para a Mongólia e fui até Ulaanbaatar, cidade que tive como base para explorar o resto do país. Por fim, passei a fronteira para a China, e percorri o caminho até Pequim, de onde aproveitei para ir também até Xi’an.

Russia

Foto de A.L. do site Unsplash

Esta é aquelas viagens que nos marcam para sempre, por todas as coisas que vemos e todas as experiências que nos proporcionam. Fiz tanto e vi tanto numa só viagem… Maravilhei-me com as lindíssimas obras de arte do Hermitage e conheci um pouco mais sobre a época dos Czars. Percorri o Kremlin e vi Lenin embalsamado. Conheci o mais profundo lago de água doce do mundo, o Lago Baikal, que é tão extenso que parece mar. Entrei em igrejas ortodoxas e em templos budistas. Andei de cavalo e de camelo por planícies e estepes. Tive a Grande Muralha da China praticamente só para mim e estive cara-a-cara com os Guerreiros de Terracota de Xi’an. Passei 4 dias num comboio sem tomar banho, passei outros 4 dias a explorar a Mongólia usando apenas toalhitas húmidas para me limpar. Apanhei uma tosse que me deixava quase sem ar quando fazia um pouco mais de esforço. Mas segui em frente, sempre. E, acima de tudo, conheci pessoas fantásticas. Pessoas que, vendo a minha tosse, me queriam dar remédios. Pessoas que, mesmo não falando a mesma língua, queriam comunicar comigo, saber o que fazia ali, de onde era e para onde ia. Pessoas que me ofereceram comida, apenas porque queriam partilhar o seu farnel. As diferenças culturais entre os 3 países são enormes, e sim, cada pessoa que habita este planeta é diferente. Mas bem vistas as coisas, temos mais semelhanças do que seria possível imaginar.

7 - Gostas de dormir em comboios portanto... então e hostels? Tens experiências positivas de alojamento em hostels? Achas que ainda existe algum preconceito em relação aos hostels? Que são perigosos ou pouco higiénicos...

Nice Way Porto

Quando os comboios têm camas, dorme-se lá muito bem! Mas relativamente a tipos de alojamento, confesso que o meu preferido é mesmo o hostel, tanto que é onde fico na maior parte das minhas viagens. Sei que há algumas pessoas que não se sentem confortáveis a partilhar o espaço de dormir com estranhos, por exemplo. Mas hostel não é sinónimo para camarata, e hoje em dia existem opções para todos os gostos. Já fiquei em hostels muito melhores do que alguns hotéis, por exemplo. Muitos deles têm camaratas, sim, mas também oferecem quartos duplos. No geral, são mais económicos e têm um ambiente muito descontraído, o que me agrada bastante. A grande maioria tem cozinha, o que é extremamente útil para preparar algumas refeições. Não podemos estar sempre a comer em restaurantes, não é? :)

Nice Way Sintra

Não sei se ainda existe esse preconceito de serem perigosos ou pouco higiénicos, mas existe algum em relação à faixa etária. Tem-se a ideia de que os hostels são mais utilizados para pessoas mais jovens. Sem dúvida que há mais jovens, mas penso que essa realidade esteja a começar a mudar. E há cada vez mais hostels com uma qualidade incrível a um preço muito em conta, encontra um ao teu gosto em Hostelsclub.com!

8 - Por último, queres falar um pouco de como é que surgiu a ideia de escrever um blog?

Sobrevivi até aqui! E pelos vistos tu também, caro leitor (obrigada!). Sem querer demorar muito a ir aos confins do tempo, o meu blogue surgiu lá em 2006. Na altura, queria apenas ter um espaço para dar asas à minha paixão pela escrita, e publicava textos de ficção, pequenos contos, coisas que ia escrevendo por aí. Em 2015 fiz um Interrail e decidi que queria partilhar a minha experiência. Para mais tarde recordar. E porque achei que alguém poderia considerar útil o meu testemunho, ficando também com vontade de partir em viagem. O que eu não sabia é que, a partir desse momento, ia nascer em mim o bichinho da escrita de viagens. O nome manteve-se (sempre foi Mundo Indefinido) mas o conteúdo mudou. Em 2016 comecei a levar o blogue mais a sério mas foi só em 2017 que as publicações ficaram regulares. Talvez porque sinto que finalmente encontrei o meu propósito.

Eu acredito num turismo ético, sustentável, que contribua para o desenvolvimento das populações e para a economia local. Com o meu blogue, quero incentivar as pessoas a viajarem mais, sim, mas também melhor. Como? Tendo em conta a sustentabilidade e os seus 3 pilares (económica, social e ambiental), e com mais conhecimento do mundo que nos rodeia, com toda a sua história, cultura e tradições. E é isso que eu tento partilhar.

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